1º ANO DE TEOLOGIA – SÃO PAULO - 1962
Dia 22 de março de 1962
“My Diary”, segundo dizia aquela famosa música do Neil
Sedaka.
São Paulo 4+100+tão, terra da garoa!
Agora o negócio é sério, teologia, etc. Quando tiver tempo
falarei com você, meu diário. Serão conversas informais, de amigo
para amigo.
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Agora, quando estava fazendo minha leitura espiritual com Michel
Quoist, (um dos livros mais badalados à
época, orações em forma de poesia),
veio-me à lembrança uma aula do Pe. Araújo. Falando-nos sobre
liberdade e consagração a Deus, dizia: Se a gente solta um
passarinho, não sente remorsos, pois, embora lhe neguemos então
comida e água garantida, consolamo-nos por havê-lo posto a solto.
Ninguém também haveria de lamentar a sorte do passarinho pelo fato
de saber que o alcance de suas asas, por exemplo, não passa de um
raio de 50 quilômetros; ninguém diria “Coitado, não pode voar
100 km”. Assim também acontece na consagração a Deus. Saímos da
gaiola que nos permitiria umas tantas liberdades e entregamo-nos à
liberdade plena... que diferença... “omnis comparatio claudicat
unius pedis”. (= Toda
comparação manca de uma perna”)
Passei o dia um tanto chateado. Não assisti missa nem comunguei,
não estudei, embora tenha feito outras atividades necessárias, não
saí a passeio – encerei o quarto – enfim, fiquei meio na baixa!
Dia 30 de março de 1962
Eis aí! Os dispersos crônico ... Realizar é saber
concentrar-se. Muitas vezes a gente reclama de falta de tempo. Creio
que é falta de decisão. Nestes dias tenho me observado.
Recomecei este trabalho de C.C. (Cineclube
e Cineforum). Mas quanto tempo
perdi e em quantos sonhos me perdi! Caramba! Não sei, cheguei, às
vezes, a abrir todos os livros e cadernos... e ficar olhando para
algum ponto que não existia, ou pegava um assunto qualquer... quando
acordava uns 20 minutos já tinham ido! ...
É o Dalle Carnegie (autor
de um grande Best-seller à época de onde copiei – mesmo –
alguns desenhos que aparecem na publicação sobre Cineclube):
Fechar em compartimentos hermeticamente fechados, ou, se quiser, “age
quod agis”. (= faça bem feito
o que estiver fazendo) É
dedicar-se profundamente. Não ficar indeciso. Começar logo. Fazer
algo. Uma coisa de cada vez. “Quem tudo quer... “
Pe. Vasconcelos é o fino. Gostei muito
daquele disco. Pensei em presenteá-lo à Mamãe. Vamos ver. Devo me
lembrar que sou estudante, etc.
O basquete hoje saiu formidável! Deo
Gratias. Bye, bye!
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Dia 4 de outubro de 1962
“Eco ao longo dos meus passos”. Meus
passos terão eco? Ou eu sou um sujeito frustrado. Às vezes, o caos
me ameaça.
Gozado: crise interna, crise nas minhas
relações (no catecismo), crise no Brasil, crise no mundo. Acho que
esse descontentamento e sinal de que “só na outra vida é que
conseguiremos a felicidade!” Crise e problemas sucessivos. (uau!)
Eu, particularmente: o que progredi? 1° ano
de Teologia! Nem o problema da pontualidade no levantar eu consegui.
Desse jeito não vai. A espiritualidade tem que partir de alguns
pontos concretos. O meu ponto de honra por agora vai ser o levantar,
tá?! Pequeno, mas...
E a crise no catecismo? Nossas relações,
cortadas. Júlio renunciou. Faur também. E eu? Puxa vida, é preciso
fé mesmo aqui no seminário. Será que depois de 10 anos de
seminário (ou 14 para o Vicente e o outro)
não se aprendeu a fugir de intrigas? ... Peço resistência e ajuda
do Senhor. Que coisa! Por que fizeram isso?
E eu, que farei nessas circunstâncias? Renunciar? Continuar
sozinho? Interessante que foi nessa ocasião que estava lendo em “O
Silêncio de Deus” a parte de Bernanos em que a paixão aparece na
vida do homem. O “Padre da Aldeia” (preciso ler o livro) foi um
fracasso atrás de fracasso. Entre sua paixão e morte fez bem aos
outros. Sta. Terezinha... que atualidade dessa santa ... e agora vem
essa paixão e morte do nosso catecismo! Se aqui no seminário
acontece isto devo ficar prevenido para o que der e vier mais tarde.
Não sei ainda o que fazer. Compromete tudo: o 1° ano, o grupo da
diocese (de Campinas),
etc. etc. Mons. Ulhoa tinha razão de sobra ontem quando falou sobre
a catolicidade no seminário... não se fechar em grupos e
igrejinhas. O nosso trabalho foi tomado como fracasso e julgado por
gente incompetente. Fazei com que meu ódio diminua Senhor!
E a crise brasileira! Da Igreja e do Estado!
As eleições estão aí. Tão dizendo que o JB vai ganhar. (José
Bonifácio Coutinho Nogueira, candidato a Governador de São Paulo;
perdeu para Ademar de Barros). O
plebiscito será em janeiro... e a Igreja? Bem, o Concílio está aí
e ... (plebiscito – fomos
convidados e escolher entre Parlamentarismo – votar sim e
Presidencialismo – votar não; foi realizado no dia 6 de janeiro de
1963, no dia da ordenação do Pe. Nadai; fomos à ordenação e
votamos em Americana; podia-se votar em qualquer lugar; o governo, de
João Goulart, fez propaganda para a votação “não”, que ganhou
estourado; desde a renúncia de Jânio o Brasil tinha experimentado o
Parlamentarismo sem grande sucesso e o Jango forçou o plebiscito e
derrubou o Parlamentarismo)
Bem, hoje é dia de retiro e é sobre o Concílio. Acho que não
tem o que pensar. O jeito é rezar e abrir a vontade para aceitar as
deliberações. “Veni Creator Spiritus” (Venha,
Espírito Criador)
Chove; o dia está horroroso.
Nota bene: fui ler a 1ª página do meu diário e encontrei
referência ao caso do Chasseraux, em Aparecida, com o Júlio... ele
já aparecia na 1ª página. Senhor! (que
encrenca seria essa?)
Pe. Charbel falou do aspecto: sacerdote – vítima, que o
sacerdote deve possuir. (hum!)
Todo o cristão também, mas o sacerdote sobretudo. Enfim, é Charles
Moeller secundado. Ler fim do livro “O Silêncio de Deus”. É
tudo. (agora que lembrei; esse
livro faz parte de uma pequena coleção muito bacana escrita por
esse padre, ou seja, esse citado, 2° é “A Fé em Jesus Cristo”
e 3 ° é “A Esperança Cristã”; esse escritor escolhe alguns
autores da atualidade – por exemplo, Graham Greene – e faz uma
análise do autor do ponto de vista do título do livro; tenho
os 3 livros até hoje)
Dia 6 de outubro de 1962
Vésperas das eleições. Não sei ainda em quem votar ou se “não
votar”. Creio que o JB ganha.
Preciso escrever para casa; fica para amanhã. Inclusive pedir
dinheiro. Como é chata a nossa situação... nessa base não vai. É
um martírio todas as vezes de pedir dinheiro. Que fazer. É o jeito.
Graham Green é grande. (O livro)
“Poder e Glória” me fascina!
O trabalho de sociologia vai esperar um pouco até eu falar ao
Barizon. Cine-clube ...
Dia 10 de outubro de 1962
Não confessei mesmo. É a crise? Vou mudar de confessor! Que
solução!... E a tonsura. Vou pedir ou não.
Viram só. O “promessão” vem aí. Ademar (de
Barros) é a solução. O “ratão”
está ganhando e creio que vai se manter na posição onde está. E o
JB é o 3°... é o máximo. Seria reação contra o “janismo”.
Provável. Jânio perdeu muitos votos até na Vila Maria. Diz-se que
fez discurso bêbado, completamente... Pe. Saba diz que Jânio é
assunto encerrado. Videbimus!... (=
“veremos” - meu momento profético... Jânio voltou à Prefeitura
de São Paulo anos depois).
Prouvera a Deus assim fosse.
E o Concílio está às portas. Rezemos. O
mais, não adianta falar. O Espírito vai baixar mesmo. Esperemos.
Aliás, por falar em Concílio, escrevi para
casa. Daqui a uns tantos dias escreverei de novo a fim de ...
etecétera. Vamos fazer algo ....
Essas 3 balas em cima da mesa – as últimas
da presente provisão – representam o desespero grahamgreeniano. É
a tábua da salvação... (!) Analogia “proporcionalitatis
impropriíssima” (= analogia
muito imprópria – brincadeira com expressões dos livros que
estudávamos)
Dia 21 de outubro de 1962
Realmente foi a primeira vez (que me lembro). Essas coisas parecem
que são vistas de outra maneira quando se leva em consideração uns
tantos pontos. No (exame)
de Liturgia, por exemplo, não deu tempo de ler o resumo (doença!),
e as folhas de D. Vagagini (ou D. Bernardo...) (?)
são muito confusas. Acabei colando mesmo! O de
Hebraico fiz seriamente.
O Concílio aí está! 5 bispos brasileiros nas comissões: D.
Agnelo (Rossi, cardeal de S. Paulo),
D. Eugênio (Sales),
D. Vicente Scherer, D. Delboux e um prelado apostólico; os italianos
são agora em minoria nessas comissões. A que o E. Santo (?!)
tem que recorrer! Deus respeita a liberdade humana ... e sabe as
consequências de tal ato.
A doença me pôs em alerta. Fiquei trancafiado todos esses dias.
Esse São Paulo (frio em outubro!) não deixa doente sair de casa.
Estou melhor agora, embora a dor de cabeça parece que ainda não
resolveu me abandonar.
E com isto um pouco da vontade de escrever se foi. Mas preciso
retomar o trabalho de Cine-clube e Cineforum, etc.
O “snooker” chegou e a turminha dos viciados logo vai se
definir. Bateu o sinal para Vésperas...
2º ANO DE TEOLOGIA – SÃO PAULO - 1963
Dia 11 de outubro de 1963
Viu! Quase um ano após. Vamos ver se o negócio pega mesmo.
Acabou a aula do Pe. Araújo, que enforquei – ameaça de dor de
barriga e outras coisas por fazer, inclusive escrever aqui.
Preciso descer para o almoço. Depois assistirei ao filme dos
anõezinhos.
Ontem fiz um retiro bastante mixuruca. Não aproveitei quase nada.
Um pouco pelo que me abate: a “Equipe de Vida”, que de vida até
agora nada houve. Fiquei chateado na última reunião. Pois tal
fulano Urbano (quem seria?)
(até mesmo rima...) achou que a Equipe de Dirigentes passou por
cima, etc. Mas, santo Deus, coloca-se princípios e se não os
cumpre. Confia-se na Equipe de Dirigentes e se não confia. Então eu
me reuni, 3 horas, num domingo
à tarde, para impor minha
idéia, me reuni com os outros do 2° ano para empurrá-los a aceitar
o 2° ponto? Depois, se aquele grande grupo de descontentes tivesse
desanimado os dirigentes... mas parece que não aconteceu. Parece que
só platonicamente havia tal grande grupo.
Por isso existe muita mediocridade no
seminário. Aceitamos tudo pela metade. Nós e os superiores. Eles
colocam outros princípios dos quais temem as conseqüências. Nós
também queremos certas coisas (a equipe) e não queremos. Isto (eu)
conversava com o Alfredo (um
colega de Sorocaba), na
quarta-feira à noite. Será que existem mesmo os tais que não
querem nada com nada (Absolute dicto ...)
(= absolutamente falando)? (Se
a memória não me falha, o Alfredo foi um dos que tomaram a frente
para escrever uma carta à Comissão de Bispos com sugestões de
mudanças no seminário, carta esta da qual participei e foi a causa
principal da minha expulsão. Acharam que fui um dos articuladores da
carta, e, na verdade, não fui. Ajudei na redação final).
Mas a minha crise interna (crise?) ainda continua. Preguiça,
principalmente. Fr. Zacarias, nosso Diretor Espiritual, acha que devo
cortar pela raiz e confessar agora toda semana. Não consegui ainda.
É a famosa preguiça, aliada a certa falta de oração, que podemos
chamar de tibieza...
Não, o retiro de ontem não pegou nada mesmo. Quem sabe algo da
palestra do Roxo. E olha lá!
Estou cansadíssimo de um jogo de basquete que, aliás, está
quase impraticável. Poeira + calor = cansaço. Estou entregue. Assim
mesmo traduzi algumas coisas para o Zé Ernani (fiz
a tradução do francês de um “guia prático” com dicas de
atendimento no confessionário; traduzi e faturei uma graninha).
Será que estou mesmo precisando de algum descanso? Como?
Dia 14 de outubro de 1963
O pessoal gostou muito daquele filme dos
anões de Roterburg (?). Muito bem feito, mesmo. Colorido e “décor”
espetaculares. Os meninos trabalham bem. (um
colega, alemão da gema, conseguia esses filmes no Consulado Alemão
e a gente passava de dia numa sala que era fácil de escurecer, junto
ao campo de futebol)
Ontem à noite também passamos o “Cinema Lumière”, (devia
ser um filme do consulado da França, talvez) explicado
por mim. Os que estavam gostaram. Etc.
O dia 12 passou com cerimônias, disputa escolástica: comunhão,
forma da Igreja. O interessante é que no dia anterior havia sido
Festa da MATERNIDADE DIVINA DE N. SENHORA... e sem comemoração
alguma. Ninguèm se lembrou. Bárbaro! Onde está a teologia mariana?
Quiçá seja esta a maior festa da Virgem, quase que a maior honra da
Virgem, o mistério central da Mariologia. Vamos ver se o Concílio
propõe algo de novo sobre mariologia.
Por falar em Concílio, a missa em língua vernácula foi aprovada
mesmo. Como? Não sei. Parece que cada Conferência Nacional vai
fazer o “como”... sobre as Conferências Nacionais, o famoso Dom
Sigaud está com medo que a mesma lhe venha tirar a autoridade ...
mas o fato é que estão estudando bem a autoridade a dar às
Conferências Nacionais. (D. Sigaud e D.
Mayer eram bispos intimamente ligados ao movimento tradicionalista
T.F.P. – Tradição, Família e Propriedade; esse movimento até
possuía Fazenda em Amparo e, segundo alguns, havia até treinamento
militar nesse local)
Estou ruim para escrever, especialmente agora, durante a aula do
Pe. Charbel.
Dia 15 de outubro de 1963
Aula do Scritzky. É o máximo. Ele é poliglota. Fala 2 línguas
ao mesmo tempo.
Ontem houve mais uma das famosas “Equipes de Vida”. No começo
do estudo da tarde fizemos uma reunião, Faur, Costa, Geraldo e Eu.
Desânimo geral em meio a desânimo. As equipes estão por um fio.
Nós estamos numa confusão geral. Não sabemos o que ainda subsiste.
Falamos de um montão de assuntos. A gente não sabe nem para onde
vai. É a idade Moloch. (deus dos
fenícios e cananeus). Não sei
nem o que escrever aqui pois está tudo “per modum confusioris
conceptus” (frase utilizada às
vezes para dizer que a coisa estava mesmo confusa; tradução: “na
forma de um conceito confuso”) Na
equipe, à noite, a turma achou também que assim não vai. Se não
vai... então propus à turma estudar o problema e apresentar alguma
solução: livre, com quem quiser, etc. Vamos ver como é que vai
ficar.
Dia 18 de outubro de 1963
Ontem não escrevi. Não houve aula!
Fui até a Cinedistri (distribuidora
de filmes). O seu Antonio disse
para mandar uma carta, que depois podíamos escolher uma data... para
ver “O Pagador de Promessas”. Quase tudo pifou! O Lísias –
rapaz ultra legal – arrumou para nós. Fui falar com o Simas (Mons.
Simas, Reitor do Seminário) e
ele não gostou da história. Por causa das más notícias que correm
sobre o (Seminário) Central.
Calúnicas, é claro. (Parece que a última [calúnia
!?] conhecida veio por intermédio
do Sinibaldi x Bonnuommo) (mau homem?). Mons. Ulhoa também foi da
mesma opinião. Eu achei que têm alguma razão. De fato, esse clero
é de morte. Imagine só o seminário assistindo a um filme
anticlerical. Seria o cúmulo – diria o beatério e boatério. Mas,
fica para a próxima vez. Quem sabe no mês que vem!... os chefes da
Cinedistri estão com muito boa vontade. Vamos ver o que vai dar.
Fazemos votos que...
Depois fui à S. Bento (Mosteiro de
São Bento). Queria confessar.
Foi a 3ª vez que lá fui, sem me confessar. Porém, consegui fazer
algum exame de consciência, o que não o tinha nas vezes anteriores.
Gozado como naquele exato momento não tive mais ânimo, nem de
continuar o exame de consciência. Desde tal momento! Puxa, e não
adiantou mesmo fazer mais esforço pois não deu mesmo. E saí da
Igreja. Vamos ver 4ª feira que vem, ou 3ª feira pois 4ª vai haver
Hora Santa na (Igreja de)
Sta. Efigênia.
Padre Araújo falou, com razão, que precisamos conhecer mais a
psicologia feminina. Precisamos dar algum jeito. Ler obras novas. Não
sei. Pensar bem.
Dia 2 de outubro de 1963
Aula de DC (Direito Canônico).
Perda de tempo legal mas indeliberada. É uma pena.
Temos um azar tremendo! Quando se deixa ir
no cinema, ou o filme é abacaxi (“José do Egito”), ou o preço
é salgado: $500,00. Muito obrigado! Só mesmo se for “na lábia”.
Por causa dos exames do seminário e 1°
ano, tivemos sábado e segunda sem aulas. Muito bom. Estudei para o
Bacharelado (“Baccalaurea”). É só o livro do Roxo: “De Verbo
Incarnato”, Teologia do Cristo.
Houve eleição domingo. Claro que a maioria
votou no Meirelles (candidato a
deputado, autor de um livro famoso à época sobre “Reforma
Agrária”). É bom sujeito. Os
resultados são poucos e não dá para perceber quem vai ganhar, quem
não. O PDC (Partido Democrático
Cristão era o partido do conhecido deputado Franco Montoro) estava
ontem em 5° lugar. Ainda acho que a má campanha do JB para
governador prejudicou sensivelmente o PDC.
Por falar em PDC, Paulo de Tarso renunciou.
Por que, caramba! Porque ele não “agüentou a mão”? Estava
fazendo muita coisa boa. Se os cristãos esmorecem – também essa
bendita nação! ... – então não reclamem se o Jango coloca gente
comunista. Foi, para mim, uma pequena falta de firmeza do Paulo.
(acho que esse Paulo de Tarso
Santos a que me referia é o mesmo que tem se candidatado pelo PSOL a
alguns cargos públicos)
Gozado! Ontem, na reunião de equipe, Cardozo falou da Academia.
Realmente, a gente encara um cargo na Academia como se fosse um peso.
Com certa razão, às vezes. Desconfiança dos colegas, falta de
apoio dos superiores. Comparei também com a minha situação de
Coordenador da Equipe. É um peso. Um “cano”. Vamos ver como é
que sairá a famosa eleição da Academia. Não sei qual a futura
minha atitude no caso de ser eleito para os 6 mais ou mesmo para os 3
mais. O chato é que os outros votáveis estão também com cargos,
etc. Estou em situação difícil. Tenho certa tendência a brigar
com os superiores para certas coisas...
Dia 26 de outubro de 1963
Aula do Pe. Araújo.
Ontem fizemos reunião de Campinas. É desejo de todos - ? –
pelo menos parece, pois ninguém está contra mesmo, que haja um
encontro, contacto, com os (seminaristas)
menores e os filósofos (de Campinas).
Sempre achei isso bárbaro. Gosto desses tipos de encontros, matar
saudades, etc. Não sei se por causa da minha dificuldade normal de
conversar com os que estão junto comigo! Não sei. Pode ser uma
influência de minha psique. Mas que é coisa boa, é. Isso sim.
Dia 28 de outubro de 1963
Ainda ressoa em mim o que Mons. Ulhoa falou de mim na reunião de
Apostolado. Não gostei de ficar espalhando por aí que o próprio
bispo (claro, D. Miele quando Reitor [de
Aparecida]...) falou que sou super-especializado em
cinema. Afinal de contas, não sei o que Mons. quer que eu faça para
sair dessa “super-especialização”! Vou conversar com ele.
Estudar estou estudando, e como nunca. Estou fichando a matéria de
Dogma. Claro, estudando com calma, sem afobação. Que eu sei cinema
demais é bobagem. Tenho somente 3 livros sobre a matéria, não
tenho lido nenhum integralmente. Pode ser que no ano passado, quando
ainda escrevia o “Cine-clubismo e Cine-forum” estivesse muito
ocupado com cinema. Mas era por causa do dito cujo. Agora não. Não
sei o que quer que eu faça. Procuro me atualizar quanto aos modos de
apostolado, Ação Católica, MFC (Movimento
Familiar Cristão), Legião (de
Maria – acho), o que queira. Só que não estudei
melhor por falta de chance. Não venha me dizer ele que não faço
apostolado algum nas férias, semanas litúrgicas... claro, faço
outras coisas ... Além do mais não exerci nunca apostolado
propriamente cinematográfico ... É chato ficar falando essas coisas
por aí. Vou falar com ele...
O Pe. Charbel está falando da Liturgia Sacrifical do AT. Diz que:
“se o sacerdote pecar e fizer pecar todo o povo... oferecerá um
novilho... “ Interessante! Mesmo no AT, do Deus Terrível, etc.,
havia perdão para os sacerdotes. Caramba, porque o Concílio não
propugna o perdão dos padres apóstatas, caídos; estamos, ou não,
no Testamento do Amor? Vamos esperar.
Eu ia escrever que estou estudando e com calma, a Teologia de
Cristo para o “bacalhau” (bacharelado).
Só agora é que estou assimilando melhor o Tratado da Redenção.
Achava muito confuso. E não é tanto assim, embora seja um tanto.
Falta estilo pedagógico, é muito repetido.
Dia 30 de outubro de 1963
Já fizemos o “bacalhau”. Fui bem. Não sei a nota. Respondi
sobre o modo de participação dos mistérios na Redenção. Vamos
ver. Agora, férias! Sou “Bacharel”. Bárbaro.
Estamos na aula do Chivinsky. Teria tanta coisa a escrever, dois
assuntos interessantíssimos e drásticos. Prefiro me calar, por
enquanto.
Dia 5 de novembro de 1963
Estou em ultra baixa. Mais violentamente, estou com o saco cheio.
Consegui um 10 nos exames de “bacalhau” e consegui não ser
eleito para a Academia. Foi o que me alegrou nestes dias ruins.
Também o sucesso com que realizamos o “Gabinete do Dr. Caligari”
(consegui trazer e passar esse filme famoso, mudo, para os colegas)
Depois, tudo é kaos (uáu?!)
Dois eram os assuntos que eu escrevia acima. Um é o aviso do
Mons. Ulhoa para as equipes, e o outro, qual era naquele dia? Por que
o assunto mais palpitante só estourou naquele dia à noite. Qual
seria? Ah, sim. Escrevi na quarta-feira. Então já estava em
andamento.
Começou o início do bolo (=
confusão) no aviso de Mons. Ulhoa. Queria ele que os
dirigentes falassem às equipes sobre umas tantas coisas. Mais uma
vez desafiou as equipes: “Vocês não se comprometeram a melhorar a
comunidade?”, etc. etc. Veio falando de uma tal palestra do Sr.
Cardeal para os seminaristas de Aparecida. Alguns quiseram retrucar
aos desafios de Mons., mas ele não estava disposto a sentar conosco.
Queria só nos despachar e aliviar a própria consciência.
“Fichinha” (apelido de um colega que
não sei identificar) cutucou: “Ajuda, aí”. Mas
não ajudei. De nada ia adiantar. Ele não estava disposto mesmo. E
assim acabou o aviso.
Viemos a saber dias depois que o Sr. Cardeal realmente falou
coisas bravas lá na Filosofia. Falou 1 h e 15 minutos. Falou tudo,
coisas básicas sobre o sacerdócio. Mas certas frases falou bravo.
Inclusive que estamos todos no seminário por favor
dele. Acho que não é verdade. As Dioceses nos pagam. E este
seminário é Central. Não tenho culpa. O seminário é nosso. Em
Aparecida chegaram a deixar a turma de São Paulo entrar e seguir
somente “convidados” pelos outros. O diabo é se vierem com esse
tal de compromisso, o que em nada vai mudar a crise, mas só
aumentar.
Inclusive manjei, pelo que Mons. disse, que ele permaneceria o ano
que vem, de qualquer jeito (sabemos que será como Reitor, mas isto
vem adiante ...). Que suprema (in)felicidade!
Os dirigentes saíram dos avisos na mesma. No 2° ano, já não
haveria reunião mesmo. Todo mundo viu o perigo do “assinado pelo
Sr. Cardeal ...” E ninguém queria a Assembléia, que ele insistiu
que se fizesse. “Admirabile dictu!” Já havia ele dito que não
iria mais a Assembléias. Agora é nós que não queremos, por força
das circunstâncias que estão absolutamente mais graves que antes.
Nem há termo de comparação. É kaos mesmo. Mons. Ulhoa está
absolutamente desacreditado pela turma. Mas isto vem mais adiante.
Dia
8 de novembro de 1963
Hoje é ontem, anteontem,
etc. Quem tiver ouvidos para ouvir, ouça. É que o troço
continua... é um nó só. Ontem queria escrever aqui. Mas não o
fiz. Aliás, o retiro foi naquela base. Não assisti a palestra do
Alberti, dormi desde 12,30 até as 15 hs. Também, estava com um dos
ouvidos entupido. Depois o Dito me abriu o ouvido. O Scritsky acha
que estou tomando nota. Ou pelo menos está fazendo piada.
Datilografado e anotado em 9 de
agosto de 2012
Dois pontos comuns: Michel Quoist em Poemas para Rezar. Livro bom para tirar o que declamar no Gremio Literário.
ResponderExcluirGraham Greene em O Poder e a Glória. Fascinante relato da vida de um padre perseguido pelos camisas vermelhas, no Mexico, com uma trama inglória mas cheia de bucolismo e suspense.
Comprei e reli ambos os livros.
Grego